Por Tony Volpon, em 04.08.2022

(Broadcast) – Ex-diretor da Área Internacional do Banco Central (BC) e atual estrategista-chefe da Wealth High Governance (WHG), Tony Volpon diz, em entrevista do Broadcast, que ao deslocar o horizonte de convergência da inflação para o primeiro trimestre de 2024 o BC suscita dúvidas em uma parte do mercado.

Para ele, está claro que a autoridade monetária está focando em 2024 por estar abraçando uma janela de oportunidade que vem na esteira da acomodação dos preços das commodities e otimismo do mercado em relação à inflação global. Ainda de acordo com Volpon, o BC deverá manter a Selic nos atuais 13,75% ao ano até o terceiro trimestre de 2023.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

Broadcast: Pela primeira vez desde março o BC deixou de contratar o passo seguinte da sua política monetária. Qual a sua avaliação sobre isso?

Tony Volpon: Já ficou evidente em várias reuniões que eles queriam pausar o ciclo. Mas eventos e circunstâncias como IPCA muito salgado, eventos lá fora e alta de petróleo têm impedido de fazerem esta pausa. Ultimamente, pela queda das commodities e o otimismo que o mercado está tendo, pelo menos em relação à inflação global, essa janela de oportunidade para se fazer uma pausa meio que se abriu. Eles, de certa forma, estão abraçando essa janela, não indicando que vão pausar, mas criando condições para um aumento residual pequeno de 0,25 ponto porcentual.

 

Broadcast: Mas senhor acha que eles vão dar o aumento de 0,25 ponto?

Volpon: Eu não acredito darão esse aumento na próxima reunião, não.

 

Broadcast: Outra novidade neste Copom de agosto foi a substituição do horizonte relevante de inflação de ano calendário para um horizonte quebrado. Qual sua leitura sobre essa mudança?

Volpon: Sobre essa questão do ano calendário eu acho que tem uma justificativa técnica em termos de sinalizar isso, porque se você cai imposto em um trimestre e sobe no outro, você cria como se fosse um efeito sazonal que distorce qualquer avaliação de ano sobre ano. Então, ao deslocar o horizonte para o primeiro trimestre de 2024, eles estão tentando suavizar esse impacto.

 

Broadcast: Mas isso não pode levar à leitura de que o BC está admitindo que não conseguirá reduzir a inflação em 2023?

Volpon: Isso obviamente levanta dúvidas porque acaba jogando a janela de convergência um pouco para frente. E como a gente sabe, todas as projeções têm aquela tendência de cair no tempo. E se ele joga para 2024, mostra uma inflação mais perto da meta, o que justificaria a pausa. Isso deixa parte do mercado receoso por entender que o BC está usando isso como uma artimanha de jogar o horizonte de convergência para frente, para um número menor, justificando a pausa.

 

Broadcast: Insisto, não pode ser lido como se o BC estivesse admitindo que não consegue derrubar a inflação em 2023?

Volpon: Eu diria que, retoricamente, eles não estão abandonando 2023. No comunicado diz que 2023 ainda tem peso, mas eu acho que eles estão mesmo mirando 2024.

 

Broadcast: Posso entender então que isso tem a ver com essas mexidas nos impostos?

Volpon: São coisas distintas, tá? A mensuração da inflação está meio bagunçada porque quando você reduz imposto tem deflação e, quando aumenta, tem inflação. Isso distorce, mas eles preferiram tratar isso de maneira em que o horizonte de convergência fica mais para frente e levanta essa dúvida. Eles preferem fazer isso porque conseguem mostrar uma inflação até abaixo da meta em 2024. Mas se é assim, você pode dizer que não precisa subir juros, mas está acima da meta em 2023. A questão é que uma pausa agora indica que eles estão mesmo mirando 2024.

 

Broadcast: O senhor disse achar que eles não aumentam juros em setembro. Até quando acha que esse juro fica em 13,75% ao ano?

Volpon: É difícil dizer. É fácil colocar algum número na planilha. Mas a bem da verdade, se eles estiverem na metade de 2023, aí 2024 será 100% o que eles estão mirando e as projeções atuais podem ser consideradas muito otimistas. Mas eles conseguem mostrar uma inflação na meta em 2024. Se isso continuar, chegando o meio de 2023 e se eles ainda tiverem uma inflação abaixo ou na meta (em 2024), dependendo de que trajetória de juro posta dentro dos modelos para gerar essa projeção, justificaria cortes de juros. Tudo depende de eleição e Fed, entre outras coisas. Mas o razoável seria algum relaxamento de juro no terceiro trimestre do ano que vem.